mirempet.gov.ao
Recursos Minerais
25 Julho de 2022 | 10h07 - Actualizado em 25 Julho de 2022

AS DEZ FORMAS DE INTERVENÇÃO DO ESTADO NO SECTOR MINEIRO

Ao aproximarmo-nos do final do exercício do Governo actual, uma questão fundamental, no universo mineiro, chama a nossa atenção: o actual Executivo procedeu a mudanças substanciais na forma de gestão do sector, mas estas são para durar?

Ao aproximarmo-nos do final do exercício do Governo actual, uma questão fundamental, no universo mineiro, chama a nossa atenção: o actual Executivo procedeu a mudanças substanciais na forma de gestão do sector, mas estas são para durar? Houve legitimidade para que as alterações fossem feitas em nome do Estado? 

Para responder a esta questão teremos de olhar para o conceito do Estado, o modo de intervenção e entender o legado que nos deixará o presente Governo. 

Estado é uma entidade com poder soberano para governar um povo dentro de uma área territorial delimitada. Assim, pode-se dizer que os elementos constitutivos do Estado são: poder, povo, território, governo e leis. 

Para o sociólogo alemão Max Weber (1864-1920), o que define o Estado é o monopólio do uso legítimo da força. Isto é, dentro de determinados limites territoriais, nenhum outro grupo ou instituição além do Estado tem o poder de obrigar, cobrar, taxar e punir. 

Na sua forma moderna, o Estado é constituído por um conjunto de instituições permanentes que organizam e controlam o funcionamento da sociedade. Os chamados três poderes (executivo, legislativo e judiciário) dividem entre si essas funções. 

O Governo é um grupo de pessoas que governa (dirige, administra) o Estado. Portanto, a principal diferença entre os dois é que o governo é um órgão que faz parte do Estado, cumprindo as funções de gerir os mais diversos serviços públicos e executar as leis. 

Em linha com o avançado sobre o Estado, no âmbito mineiro, é legítimo reconhecer tanto a legitimidade da sua acção, como reconhecer dez formas fundamentais da sua intervenção: 

Criação de entidades reguladoras e concessionárias, 
Participação em produções mineiras, 
Direito de requisitar produções mineiras, 
Declarar zonas de reserva mineira, 
Definir áreas disponíveis para a actividade mineira, 
Criar áreas de reserva de segurança, 
Proteger direitos das comunidades, 
Garantir realojamentos, 
Proteger a força de trabalho local, 
Proteger o mercado nacional. 

Aqui chegados, naveguemos, brevemente, por cada uma das áreas de intervenção. 

Criação de entidades reguladoras e concessionárias – de um modo geral, o Estado pode intervir economicamente no sector mineiro, quer através de entidades reguladoras e concessionárias nacionais, quer através de empresas operadoras, ficando todos esses entes sujeitos aos princípios e regras estabelecidos no Código Mineiro do País e na legislação sobre investimento público e sobre empresas públicas ou de capitais públicos. Em verdade, em nome do Estado, o Governo em exercício pode criar instituições públicas reguladoras das actividades mineiras sempre que haja necessidade de regular de modo específico o exercício da actividade mineira respectiva, ou o mercado, ou os preços, ou as exportações, ou a saúde pública, ou outros factores específicos relevantes. 

Participação em produções mineiras - o Estado participa na apropriação do produto da mineração como contrapartida pela concessão dos direitos mineiros de exploração e comercialização, podendo usar uma das seguintes formas ou ambas conjugadas: a) Participação, através de uma empresa do Estado, no capital social das sociedades comerciais a criar, não podendo essa participação ser inferior a 10%; b) Participação em espécie no produto mineral produzido em proporções a definir ao longo dos ciclos de produção, subindo a participação do Estado à medida que a Taxa Interna de Rentabilidade (TIR) for aumentando. Entretanto, compete ao Titular do Poder Executivo aprovar os critérios de participação social das empresas do Estado nas sociedades comerciais e da comparticipação em espécie nas produções de minerais produzidos face à TIR, podendo delegar essa competência no titular do órgão de tutela, no caso o Ministério dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás. 

Direito de requisitar produções mineiras - sempre que os interesses comerciais do País o exijam, relativamente ao tratamento, enriquecimento, ou acréscimo no mercado local de valor aos minerais produzidos, o Estado pode requisitar a compra das produções, ou parte delas, e adquiri-las a preços do mercado, destinando-as à indústria local. O direito de requisição do Estado aplica-se independentemente do uso, ou não, das produções na indústria local de minerais, sempre que estes tenham interesse estratégico para a segurança nacional. 

Declarar zonas de reserva mineira – as áreas do domínio territorial e marítimo sob jurisdição da República de Angola que não tenham sido atribuídas para efeitos do exercício de outras actividades, ou a elas não estejam afectadas, são consideradas disponíveis para efeitos de concessão de direitos mineiros. Neste sentido, o Executivo pode declarar zonas de reserva mineira as partes do território nacional que apresentem potencial mineiro considerável e que, em função disso, exijam a observância de restrições quanto à circulação de pessoas e bens nessas áreas. A declaração e criação de zonas de reserva mineira deve ter em conta a necessidade de garantir ou perturbar o menos possível o desenvolvimento económico e social integrado das regiões, a estabilidade social e cultural das populações locais e a segurança dos direitos e dos bens patrimoniais públicos e privados. 

Definir áreas disponíveis para a actividade mineira – tendo em vista assegurar o desenvolvimento harmonioso da economia nacional, proteger os interesses relacionados com a defesa nacional, a fauna, a flora e o ambiente, o Poder Executivo pode, nos termos da lei, estabelecer áreas excluídas ou condicionadas para a actividade geológico-mineira. Em verdade, são considerados indisponíveis para a actividade mineira, os terrenos que fazem parte do domínio público, para uso comum ou privativo do Estado, enquanto dele não forem desafectados, e as áreas que estejam excluídas da actividade geológica e mineira. 

Criar áreas de reserva de segurança - a configuração das áreas geográficas objecto dos títulos de concessão de direitos mineiros têm forma poligonal, tão regular e simples quanto possível, e é identificada através de pontos fixos definidos por coordenadas geográficas ou geodésicas ou por acidentes naturais, em conformidade com o que é estabelecido pelo órgão de tutela. 

Proteger direitos das comunidades - a política mineira deve sempre ter em conta os costumes das comunidades das áreas em que é desenvolvida a actividade de mineração e contribuir para o seu desenvolvimento económico e social sustentável. Entretanto, o órgão de tutela, em coordenação com os órgãos locais do Estado e os titulares dos direitos mineiros, deve criar mecanismos de consulta que permitam às comunidades locais afectadas pelos projectos mineiros participar activamente nas decisões relativas à protecção dos seus direitos, dentro dos limites constitucionais. O mecanismo de consulta deve integrar pessoas de reconhecida idoneidade e reputação junto das comunidades, escolhidas de acordo com os usos e costumes locais, desde que não contrariem a Constituição. A consulta é obrigatória em todos os casos em que da implementação dos projectos mineiros possa resultar a destruição ou danificação de bens materiais, culturais ou históricos pertencentes à comunidade local como um todo. 

Garantir realojamentos – as populações locais que sofram prejuízos habitacionais que impliquem a sua deslocação ou a perturbação das suas condições normais de alojamento por causa das actividades mineira têm direito a ser realojadas pelo titular da concessão respectiva. Contudo, o processo de realojamento deve respeitar os hábitos, costumes, tradições e outros aspectos culturais inerentes às referidas comunidades, desde que não contrariem a Constituição. 

Proteger a força de trabalho local - os titulares de direitos mineiros devem assegurar o emprego e a formação de técnicos e trabalhadores angolanos, preferencialmente dos que residirem nas áreas da concessão mineira, de acordo com o que estiver estabelecido legalmente. 

Proteger o mercado nacional - em condições de preços que não excedam 10% e de prazos de entrega que não ultrapassem oito dias úteis, os titulares dos direitos mineiros devem dar preferência à utilização de materiais, serviços e produtos nacionais, cuja qualidade seja compatível com a economia, segurança e eficiência das operações mineiras. Entretanto, as entidades que se sentirem prejudicadas no direito de protecção legal neste âmbito podem requerer das autoridades, administrativas ou judiciais competentes, a protecção ou o restabelecimento do mesmo, nos termos gerais do direito. Tomando, o leme intervencionista do Estado, o Governo actual aprovou um Novo Modelo de Governação integrado que trouxe novas instituições e reconfigurou outras, como seu legado construíodo nestes últimos cinco anos: 

Agência Nacional de Recursos Minerais (ANRM), criada em Junho de 2020, que para além de desenvolver as funções de concessionária nacional, é responsável pela regulação e fiscalização do sector mineiro angolano, exercendo também as funções de negociar e gerir contratos mineiros, bem como monitorizar a sua execução, 

IGEO, órgão de gestão indirecta do Estado que recolhe, guarda, gere, promove e disponibiliza a informação geológica, propriedade do Estado, 

ENDIAMA – E. P., cujo processo de restruturação está em curso, deixou de ser concessionária para os diamantes, concentrando-se no seu negócio nuclear, como operadora mineira de diamantes, 

SODIAM – E. P., empresa de domínio público, com a responsabilidade de assegurar a implementação da Nova Política de Comercialização de Diamantes e a futura operacionalização da Bolsa de Diamantes, 

Bolsa de Diamantes, ente constituído pela SODIAM e ENDIAMA, que deverá assegurar as transacções de diamantes em Angola, sob a supervisão da SODIAM, aumentando a transparência e a credibilidade na comercialização de diamantes, 

Comissão Nacional do Processo Kimberley, aumentada a notoriedade desta entidade administrativa, órgão responsável pelos procedimentos de certificação legal dos diamantes. 

Ao aproximarmo-nos do final do exercício do Governo actual, fica o legado e a demonstração, clara, de que, através do Governo, o Estado pode operar mudanças substanciais na forma de gestão do Sector de Recursos Minerais, tantas quanta a competência e o sentido de compromisso dos seus executivos o permitam. 

Sebastião Panzo* 
Consultor e Director da Bumbar Mining


Voltar